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Mario Cravo Jr

Abertura
30 de maio de 2014

Horário
19 às 22h

Exposição
31 de maio a 20 de junho

Com uma vitalidade sem paralelo na arte brasileira, aos 91 anos de idade, Mario Cravo Júnior, um dos pioneiros da arte moderna na Bahia e um dos grandes artistas brasileiros do século XX, não para de produzir. Com obras em aço, cobre, bronze e ferro, esculturas inéditas, realizadas com inovadoras soluções plásticas e formas de expressão, Mario apresenta 41 trabalhos em dimensões variadas, a partir do dia 30 de maio, das 20 às 23 horas, até 20 de junho, na Paulo Darzé Galeria de Arte.

Criando objetos, murais, painéis, relevos, desenhos, pinturas, e principalmente esculturas, utilizando tanto a madeira como o ferro, o latão, outros metais, ou a resina de poliéster, fibra de vidro, sucata, metal polido, pedra-sabão, pedra-grafite, com apropriações, montagens e remontagens, de onde surgem esculturas giratórias, Exus, Cristos, figuras, móbiles, esta é uma arte que vem sendo renovadamente criada, reelaborada em seu senso táctil, sem dependência temática, referência estilística, mas de intenso relacionamento com o mundo e as pessoas por sua experiência da forma e de intensa vitalidade e criação.

Desde o início de sua trajetória, realiza trabalhos em locais públicos, experimentando um contato direto de sua arte com o público, através de inúmeras obras urbanas, esculturas de grande porte e murais, em ruas, praças e avenidas, edifícios públicos e empresariais, mas também realizando mostras em museus, com trabalhos nos acervos dos Museus de Arte Moderna de Nova York, Jerusalém, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Pampulha em Minas Gerais; Museu de Arte de Jerusalém, Rio Grande do Sul, Bahia, Feira de Santana, São Paulo; Pinacoteca do Estado de São Paulo; Museu Afro Brasil; Fundação Armando Álvares Penteado; Museu Chácara do Céu – Fundação Raymundo de Castro Maya; Museu de Arte Sacra da Bahia; Museu da Cidade do Salvador; Museu de Antropologia da Bahia; Núcleo de Artes do Desenbahia; Museu Hermitage (Rússia); Walker Art Center (Minneapolis, Estados Unidos).

Um dos pioneiros da arte moderna na Bahia e um dos grandes artistas brasileiros do século XX, Mario nasceu em Salvador, Bahia (onde vive), em 13 de abril de 1923. Escultor, gravador, desenhista, em 1947 realizou sua primeira exposição individual, no Edifício Oceania em Salvador. De 1947 a 1949, residiu em Nova York (Estados Unidos), onde era aluno do escultor iugoslavo Ivan Mestrovic, na Escola de Belas Artes da Syracuse University.

De volta a Salvador, abriu um ateliê-oficina, que impulsionou o movimento de arte moderna na Bahia. Em 1950 iniciou pesquisa das fontes de artes popular e erudita no Norte e Nordeste do Brasil. Participou do programa Artist in Residence, em Berlim (Alemanha), realizando várias exposições nos anos de 1964 e 1965. Representou o Brasil na XXX Bienal de Veneza, como escultor convidado, e na IV Exposição Internacional da Escultura Contemporânea no Museu Rodin, Paris, França, ganhou prêmio na I Bienal de São Paulo, em 1951. Participou da XXVI Bienal de Veneza; da IV Exposição Internacional de Escultura Contemporânea no Museu Rodin, Paris; da I Exposição Bienal Internacional de Gravura de Tóquio; da I Bienal Nacional de Artes Plásticas, em Salvador, com sete esculturas criadas na proporção do claustro do Convento do Carmo, formulação até aquele momento inovadora em conceito e forma, com suas peças medindo de três a sete metros de altura.

É doutor em Belas Artes pela UFBA. Em 1981, coordenou a implantação do curso de especialização em Gravura e Escultura na Escola de Belas Artes da UFBA, em Salvador. Nessa mesma cidade, em 1994, foi inaugurado o Espaço Cravo, no Parque Metropolitano de Pituaçu, com 50 esculturas ao ar livre sob a forma de objetos tridimensionais – estáticos, móveis, e sonoros –, e uma galeria para trabalhos em várias técnicas, recentemente fechada (2017) por um insano ato estatal.

Mas Mario Cravo Júnior não para de criar novos trabalhos. Desde o começo suas esculturas e relevos em aço, em ferro, em cobre, e em latão, ou suas pinturas e desenhos trazem este ímpeto, esta não acomodação, uma criação que não o deixa quieto, sempre sendo ultrapassado pelo interesse vivo por novos materiais, por um novo foco na sua atenção, como foi recentemente com a pedra-grafite, e dele a criação de pequenos objetos. A cada novo elemento, um novo desafio. Parece ser este o seu lema. E a vida, nela a arte, incessantes desafios. Uma permanente pesquisa e indagação. Uma vitalidade sem par na arte baiana desde que iniciou com desenhos e esculturas sua trajetória nas artes plásticas, trajetória que o leva durante a caminhada a ser admirado diariamente por quem vive e transita na Bahia, nas muitas obras públicas de sua autoria espalhadas em ruas, praças e avenidas.

No atelier com Mario Cravo Júnior / Por Claudius Portugal

Uma permanente pesquisa. Uma vitalidade sem par na arte baiana desde que iniciou com desenhos e esculturas em 1948 sua trajetória nas artes plásticas. Esta trajetória o leva durante a caminhada, entre exposições coletivas e individuais e, principalmente, obras urbanas com esculturas de grande porte e murais, a representar o Brasil na XXX Bienal de Veneza, como escultor convidado, e na IV Exposição Internacional da Escultura Contemporânea no Museu Rodin, Paris-França, e ser admirado diariamente por quem vive e transita na Bahia, nas muitas obras públicas de sua autoria espalhadas em ruas, praças e avenidas.

Com uma vitalidade sem paralelo na arte brasileira, aos 91 anos de idade, Mario Cravo Júnior, um dos pioneiros da arte moderna na Bahia e um dos grandes artistas brasileiros do século XX, não para de produzir. Com obras em aço, cobre, bronze e ferro, esculturas inéditas, realizadas com inovadoras soluções plásticas e formas de expressão, Mario apresenta 41 trabalhos em dimensões variadas, a partir do dia 30 de maio, das 20 às 23 horas, até 20 de junho, na Paulo Darzé Galeria de Arte.

Mario Cravo Júnior não para de criar novos trabalhos. Agora são esculturas e relevos em aço, ferro, cobre, e latão. Este ímpeto, esta não acomodação, a certeza de luta e aprendizado na labuta incessante para criar a sua arte não o deixa quieto, e o que poderia ser o mais recente já está sendo ultrapassado pelo interesse vivo por novos materiais, em foco na sua atenção, como foi recentemente a mostra com pedra grafite, e dele a criação de pequenos objetos. A cada um novo elemento, um novo desafio.

Pergunto: Esta incessante busca de novas possibilidades, de criar e recriar, de fazer e desfazer, é uma não aceitação do seu próprio trabalho pelo desejo incansável de novos horizontes, uma rebeldia inerente a personalidade, ou uma briga permanente contra a acomodação que qualquer um pode ter ao não fincar-se num caminho já trilhado e de sucesso?

É muito difícil este questionamento de se autorreferir. Todo questionamento sobre o processo de autodefinição, estas tentativas, acaba tratando do que gostaríamos de ser e não do que somos. É uma somatória e talvez eu deva isso a uma característica da minha personalidade. Sou essencialmente curioso. Isso faz parte da minha vida, e está na minha terra, na minha primeira infância, uma curiosidade que eu tenho pela mecânica, pelas instalações, pelas máquinas, os mecanismos, isso sempre foi para mim um momento de diversão e ao mesmo tempo, então como se eu tivesse um laboratório existencial, uma pedra filosofal. É uma espécie de uma procura de uma combinação que não existe, quem sabe, uma procura de mim mesmo, eventualmente achado, mas pelo menos procurado, mas é a procura de mim mesmo, o que no fundo é a procura de minha gente, do meu povo, da minha tradição, da minha civilização.

Todas as vezes que fiz este questionamento de caráter social, sociológico ou antropológico, me vem à mente de que queiramos ou não, modernamente encarados ou não, nós somos ainda aqueles indiozinhos de Anchieta e de Vieira, nós estamos ainda, não sobre a proteção, mas sobre a sombra ou o reflexo de nossa tradição cultural, que implica no ser fundamental, ou como diria Rousseau, no paraíso perdido.

Esse meu laboratório tem também a ver com este suposto mundo novo que é também o mundo velho. Nós falamos sempre neste paradoxo do que é o futuro. Quando se chega à minha idade nós temos a possibilidade de encarar o que é o passado, o presente e um pouquinho do futuro.

Mas as coisas parecem que só acontecem quando acontecem, ou seja, a vivência e a experiência é uma somatória de um eventual fluxo da mudança para o enriquecimento do ser humano. Talvez seja através do interregno, do contraponto, que possa acontecer algumas das coisas que tentamos algumas dezenas de anos acontecerem. Eu vivo nessa expectativa. Este é o meu temperamento. Eu sou um insatisfeito.

Neste eu não aceito, a primeira vítima, vítima entre aspas, da minha rebeldia, sempre sou eu mesmo, porque se ela me compensasse, se ela fosse em si mesmo um objetivo, uma finalidade, mais do que objetivo, entendeu, eu estaria me elevando à categoria de super-humano. Pelo contrário, eu me sinto cada vez mais ligado a este processo de transição, de modificação, essa dinâmica. Talvez por isso sejamos tão ansiosos pela segurança.

Eu me habituei ao risco de tentar. Não é superar a mim mesmo não, mas de “enriquecer” a minha própria experiência, ou seja, a cada vez. Talvez seja como uma criança, ou aquela coisa simbólica da cobra comendo o rabo, e cada vez que eu mais envelheço mais jovem me sinto, e vêm naturalmente uns pensamentos deste momento, que são umas reflexões de um artista quando velho.

E prossegue:

Viver é transformar. Viver longos anos de vida é um exercício permanente de transformação e isto para mim significa a dinâmica da própria vida. Isto através de qualquer profissão. Mas como nosso ciclo é muito curto, para uns curtíssimos, mas outros, como no meu caso, que não é tão longo. Ao contrário. Depende de como você encara. Mas o que é realmente estimulante é encontrar receptividade na vida, a curiosidade da vida. Esta vitalidade que você vê é uma demonstração da continuidade, da intensidade que liga alguém ao nosso temperamento, a nossa sensibilidade, a nossa maneira de ver o mundo. Daí que eu posso falar aos noventa anos, que eu sinto energia, sou energizado por esse laboratório, esse número de materiais e de formas diferenciados, essa tentativa de combinações.

Talvez a minha curiosidade seja um acompanhamento deste viver anexando sempre a cada dia uma nova combinação na procura do eterno. A coisa começa a se envolver e passa a não existir mais esta separação de gerações. São etapas que se fundem. É uma espécie de pragmatismo separarmos tudo em compartimentos. Acho que isso é um fluxo que recebemos, vindo mais ou menos por afinidades de cada qual, mas no fundo é um grande mar para navegarmos, ou que navegamos. Este mar é uma herança que recebe um do outro, que na realidade não tem começo, nem meio, nem fim, é um fluxo. Assim sigo o jovem velho ou o velho jovem, tanto faz como tanto fez. É minha maneira de ser. O passado para um homem que vive a extensão de vida que eu tenho é um mundo extremamente misterioso, indefinido de certa forma. Viver é uma permanente surpresa.

Dentro do Espaço Cravo, Mario anda nos caminhos laterais da lagoa, e após mostrar o que está fazendo, de apresentar um a um os operários que o acompanham, diz:

Eu aprendo com estes homens que estão a trabalhar comigo. Tem peças que eles contribuíram. Ou seja, é a inserção, o diálogo. Eu sinto o cuidado, a satisfação, o carinho com que eles participam do que faço e o que eles apreendem ao contribuir com um pedacinho, e isto vale mais, muito mais.

Ao ouvir um comentário sobre o local, diz:

É uma realização de um sonho em vida, este atelier. Estou aqui há quase vinte anos como se fossem vinte dias e se este Espaço passasse a não existir amanhã eu lhe diria que estou plenamente satisfeito com a experiência e ainda vou mais um pouquinho, se tivesse que repetir, eu não mudaria absolutamente nada. Não sei se isso é excesso de autoconfiança ou que coisa misteriosa é essa, mas é o que sinto. Mas eu estou com ideia de querer transformar isso aqui, o Espaço Cravo, num memorial, é a nova terminologia, e se for possível esta proposta, de com isto trazer uma experiência que tivemos cinquenta e poucos anos atrás com a Lina Bardi, que tentamos, mas infelizmente não houve possibilidade, que é o processo artesanal de um centro de estudos em trabalhos artesanais, que é a possibilidade de fazermos um levantamento dos mestres artesãos e fazê-los produzir junto com jovens designers universitários.

Mario Cravo Júnior nasceu em Salvador, Bahia, no dia 13 de abril de 1923. Estudou nos Estados Unidos, Universidade de Syracuse, trabalhou em Nova Iorque, viveu e realizou exposições na Alemanha, como “Artists in Residence” pela Ford Foundation, ganhou prêmio na I Bienal de São Paulo, participou da XXVI Bienal de Veneza, da IV Exposição Internacional de Escultura Contemporânea no Museu Rodin, Paris, 1ª Exposição Bienal Internacional de Gravura de Tóquio, da I Bienal Nacional de Artes Plásticas, em Salvador, com sete esculturas criadas na proporção do claustro do Convento do Carmo, formulação até aquele momento inovador em conceito e forma, nas suas peças medindo de três a sete metros de altura.

Iniciando a expor individualmente em 1947 (“Mario Cravo Júnior Expõe”. Edifício Oceania. Salvador/BA e “Mario Cravo Esculturas e Desenhos”. Associação de Cultura Brasil-Estados Unidos (ACBEU). Salvador/BA), e coletivamente em 1943 (“VII Salão ALA”. Biblioteca Pública. Salvador/BA), realizou na sua trajetória mostras em galerias de várias cidades brasileiras e do exterior (New York, WashingtonDC, Minneapolis,  San Francisco, Colorado, St. Louis, nos Estados Unidos; Berlim, Munchen, Bonn, na Alemanha; Zurique, Berna, Neuchâtel, na Suiça; Santiago, Chile; Paris, França; Tokio, Japão; Madri, Espanha; Oshogbo, Lagos, Nigéria; Castellanza, Itália; Lisboa, Guimarães, Portugal; Macau, China; Buenos Aires, Argentina; Panamá, Costa Rica, Guatemala, México e Cuba.

As suas obras estão espalhadas pelo mundo nos acervos dos Museus de Arte Moderna de Nova Iorque, Jerusalém, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Pampulha em Minas Gerais; Museu de Arte de Jerusalém, Rio Grande do Sul, Bahia, Feira de Santana, São Paulo; Pinacoteca do Estado de São Paulo; Museu Afro Brasil; Fundação Armando Alvarez Penteado; Museu Chácara do Céu – Fundação Raymundo de Castro Maya; Museu de Arte Sacra da Bahia; Museu da Cidade do Salvador; Museu de Antropologia da Bahia; Núcleo de Artes da Desenbahia; Walker Art Center; e ainda nos Museu Hermitage (Rússia), Walker Art Center (Minneapolis/Estados Unidos). Entre as suas premiações temos: 2º Prêmio do 3º Salão Baiano de Belas Artes (1951); 3º Prêmio da 1ª Bienal de São Paulo/1951; 1º Prêmio do 2º Salão de Arte Paulista de Arte Moderna/1952; 2º Prêmio da 3ª Bienal de São Paulo/1955; 2º Prêmio da 1ª Exposição de Arte Sacra da Pontifícia Universidade Católica do Brasil, Rio de Janeiro/1956.

Utilizando tanto a madeira, como o aço, ferro, latão, outros metais, resina de poliéster, fibra de vidro, sucata, metal polido, pedra sabão, pedra grafite, com apropriações, montagens e remontagens, surgem esculturas giratórias, exus, cristos, figuras, móbiles, estando a sua arte sendo renovadamente criada. Desde o início de sua trajetória realiza mostras e possui trabalhos em locais públicos, experimentando um contato direto da arte com o homem urbano, aonde “a experiência da forma, a vivência criativa e o senso táctil da matéria conferem grande importância e dignidade a uma obra escultórica polimorfa e pujante”, disse Wilson Rocha, “tornando-o figura singular de excepcionalidade em nosso meio e uma das mais seguras expressões da arte brasileira”.

Eu sempre tive interesse, talvez devido ao meu temperamento rebelde, de reelaborar em cima. Eu queria interpretar o troço, entende? Eu não tinha capacidade e não tenho até hoje, a verdade seja dita, desse senso disciplinar, de uma dependência a uma temática, por exemplo, eleita. Isso foge. É possível que esta insegurança – veja bem que eu vou usar esta palavra –, esta instabilidade, seja uma das chaves da minha relativa autonomia. Porque eu nunca pensei em estabelecer uma referência estilística. Veja bem: sou um homem que faço esculturas não por impulso lógico. Eu faço isso porque em tenho imenso prazer em fazer. Eu gosto de suar, criar um problema e me consumir nele. Foi essa opção que as artes plásticas trouxeram para mim. Foi de fazer algo que realizasse o meu relacionamento com o universo, em termos de comunicação. Quer dizer, as variáveis e as modificações, elas são muito mais aparentes que reais.

E prossegue:

Porque se um dia outra pessoa se interessar em ver de perto o meu currículo na forma de objetos vai ver que há uma linha, há uma estrutura dentro dele. Uma escultura de quarenta anos passados é como se tivesse feito agora. Como eu posso retornar também a abordar uma problemática aqui em poucos segundos. Eu não tenho uma justificativa intelectual para o retorno, como a soma de materiais. Entendeu o que é? Às vezes estou interessado num assunto. Faço uma série de objetos que me levam de volta ao convívio e emoções de minha primeiríssima infância. Esse negócio de quatro, cinco anos de idade. Os objetos móveis que faço e que me divertem profundamente. Por que razão? Mas não há razão para você se rever num processo de reelaboração e de recriação.

Para finalizar diz:

Os homens estão sempre querendo explicações para um ato que não tem explicações. Não há necessidade ao ato criador de uma explicação. A não ser ele próprio. As pessoas tem muita dificuldade em apreender o sentido da liberdade – liberdade entre aspas – da criatividade. As pessoas sempre perguntam: O que isso significa? E eu dizia: Mas não significa, a coisa é. Gostem ou não gostem, seja simpático ou não. Tudo bem, mas a significação é o ser. Para mim, arte é resposta. Não sou eu que faço a polêmica. Eu estimulo, eu libero as formas.

Esta incessante busca de novas possibilidades, de criar e recriar, de fazer e desfazer é uma não aceitação do seu próprio trabalho pelo desejo incansável de novos horizontes, uma rebeldia inerente à personalidade, ou uma briga permanente contra a acomodação que qualquer um pode ter ao não se fincar num caminho já trilhado e de sucesso?

É muito difícil este questionamento de se autorreferir. Todo questionamento sobre o processo de autodefinição acaba tratando do que gostaríamos de ser e não do que somos. É uma somatória e talvez eu deva isso a uma característica da minha personalidade. Sou essencialmente curioso. Isso faz parte da minha vida, e está na minha terra, na minha primeira infância, uma curiosidade que eu tenho pela mecânica, pelas instalações, pelas máquinas, os mecanismos. Isso sempre foi para mim um momento de diversão e, ao mesmo tempo, então como se eu tivesse um laboratório existencial, uma pedra filosofal.

É uma espécie de procura de uma combinação que não existe, quem sabe, uma procura de mim mesmo, eventualmente achado, mas pelo menos procurado, mas é a procura de mim mesmo, o que no fundo é a procura de minha gente, do meu povo, da minha tradição, da minha civilização.

Todas as vezes que fiz este questionamento de caráter social, sociológico ou antropológico, me vem à mente que queiramos ou não, modernamente encarados ou não, nós somos ainda aqueles indiozinhos de Anchieta e de Vieira, nós estamos ainda, não sob a proteção, mas sob a sombra ou o reflexo de nossa tradição cultural, que implica no ser fundamental, ou como diria Rousseau, no paraíso perdido.

Esse meu laboratório tem também a ver com este suposto mundo novo que é também o mundo velho. Nós falamos sempre neste paradoxo do que é o futuro. Quando se chega à minha idade, nós temos a possibilidade de encarar o que é o passado, o presente e um pouquinho do futuro.

Mas as coisas parecem que só acontecem quando acontecem, ou seja, a vivência e a experiência são uma somatória de um eventual fluxo da mudança para o enriquecimento do ser humano. Talvez através do interregno, do contraponto, possam acontecer algumas das coisas que tentamos algumas dezenas de anos acontecerem. Eu vivo nessa expectativa. Este é o meu temperamento. Eu sou um insatisfeito.

Neste eu não aceito, a primeira vítima, vítima entre aspas, da minha rebeldia, sempre sou eu mesmo, porque se ela me compensasse, se ela fosse em si mesma um objetivo, uma finalidade, mais do que objetivo, entendeu, eu estaria me elevando à categoria de super-humano. Pelo contrário, eu me sinto cada vez mais ligado a este processo de transição, de modificação, essa dinâmica. Talvez por isso sejamos tão ansiosos pela segurança.

Eu me habituei ao risco de tentar. Não é superar a mim mesmo não, mas de “enriquecer” a minha própria experiência, ou seja, cada vez. Talvez seja como uma criança, ou aquela coisa simbólica da cobra comendo o rabo, cada vez que mais envelheço, mais jovem me sinto, e vêm naturalmente uns pensamentos deste momento, que são umas reflexões de um artista quando velho.

E prossegue:

Viver é transformar. Viver longos anos de vida é um exercício permanente de transformação e isto para mim significa a dinâmica da própria vida, isto através de qualquer profissão. Mas, como nosso ciclo é muito curto, para uns curtíssimos, mas outros, como no meu caso, que não é tão longo. Ao contrário. Depende de como você encara. Mas o que é realmente estimulante é encontrar receptividade na vida, a curiosidade da vida.

Esta vitalidade que você vê é uma demonstração da continuidade, da intensidade que liga alguém ao nosso temperamento, à nossa sensibilidade, à nossa maneira de ver o mundo. Daí, eu posso falar, aos 85 anos, que eu sinto energia, sou energizado por esse laboratório, esse número de materiais e de formas diferenciados, essa tentativa de combinações.

Talvez a minha curiosidade seja um acompanhamento deste viver anexando sempre a cada dia uma nova combinação à procura do eterno. A coisa começa a se envolver e passa a não existir mais esta separação de gerações. São etapas que se fundem. É uma espécie de pragmatismo separarmos tudo em compartimentos. Acho que isso é um fluxo que recebemos, vindo mais ou menos por afinidades de cada qual, mas no fundo é um grande mar para navegarmos, ou que navegamos. Este mar é uma herança que recebe um do outro, que na realidade não tem começo nem meio nem fim, é um fluxo. Assim sigo o jovem velho ou o velho jovem, tanto faz como tanto fez. É minha maneira de ser. O passado para um homem que vive a extensão de vida que eu tenho é um mundo extremamente misterioso, indefinido de certa forma. Viver é uma permanente surpresa.

Mário Cravo Júnior nasceu em 13 de abril de 1923, em Salvador, Bahia. Graduou-se em Belas Artes pela Universidade Federal da Bahia e, em 1947, seguiu para os Estados Unidos como aluno especial do escultor iugoslavo Ivan Mestrovic, na Universidade de Syracuse. Com a volta, como livre docente, exerceu interinamente, na Universidade Federal da Bahia, a cátedra de gravura, talho doce, água-forte e xilografia, sendo logo depois professor de nível superior na disciplina escultura em madeira, pedra e metais.

Tornou-se doutor em Belas Artes e professor adjunto na Escola de Belas Artes em 1966. A partir de 1976, executou o projeto inicial de pós-graduação na área de Artes Plásticas. Em 1981, coordenou a implantação do curso de especialização em gravura e escultura, tudo isso na Universidade Federal da Bahia.

Dentro do Espaço Cravo, Mário anda nos caminhos laterais da lagoa, e, após mostrar o que está fazendo, de apresentar um a um os operários que o acompanham, diz:

Eu aprendo com estes homens que estão a trabalhar comigo. Tem peças que eles contribuíram. Ou seja, é a inserção, o diálogo. Eu sinto o cuidado, a satisfação, o carinho com que eles participam do que faço, o que eles apreendem ao contribuir com um pedacinho, e isto vale mais, muito mais.

Ao ouvir um comentário sobre o local, diz:

É uma realização de um sonho em vida, este ateliê. Estou aqui há quatorze anos como se fossem quatorze dias, e, se este espaço passasse a não existir amanhã, eu lhe diria que estou plenamente satisfeito com a experiência e ainda vou mais um pouquinho: se tivesse que repetir, eu não mudaria absolutamente nada. Não sei se isso é excesso de autoconfiança ou que coisa misteriosa é essa, mas é o que sinto. Mas eu estou com ideia de querer transformar isso aqui, o Espaço Cravo, num memorial, é a nova terminologia. E se for possível esta proposta, trazer com isso uma experiência que tivemos cinquenta e poucos anos atrás com a Lina Bardi, que tentamos, mas infelizmente não houve possibilidade, que é o processo artesanal de um centro de estudos em trabalhos artesanais, a possibilidade de fazermos um levantamento dos mestres artesãos e fazê-los produzir junto com jovens designers universitários.

Quando será a próxima exposição? E os trabalhos serão em cobre, aço e latão, ou os em pedra-grafite?

No próximo ano. Não sei como será, pois em cinco ou seis meses pode acontecer um outro elemento e mudar tudo. Minha disposição é sempre o momento. O momento em que se vive. Expor é nos expor. É nos desnudarmos para aqueles outros que se interessam, por você como homem, como artista, como criador.

(entrevista / setembro de 2007)

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