ANIMA
Palavra de origem latina que designa a parte individual de cada ser humano, a “alma”. Em latim, literalmente: “sopro, brisa, ar”. Possivelmente a partir daí adquiriu sentido de “sopro vital”, “alma”, já que para a humanidade a alma está relacionada a algo imaterial, intangível e espiritual.
Em “Anima”, exposição individual de Christian Cravo, na Paulo Darzé Galeria, o artista visual que tem como suporte a fotografia, apresenta um novo conjunto de 32 imagens realizadas entre 2012 e 2022. Na elaboração desse projeto, o artista utiliza duas séries distintas, porém ambas produzidas em tempos praticamente concomitantes.
Ao passo de Christian passar longas temporadas no continente africano se dedicando a sua difundida série “Luz e Sombra”, que lhe rendeu três publicações e seis mostras, ao voltar de suas viagens, “Anima” vinha nascendo de forma silenciosa e oculta para o público. Durante seus retornos para casa, sua esposa Adriana e suas três filhas, Sophia, Helena e Stella, eram suas musas e fontes de inspiração.
Apesar do novo recorte, permanecemos diante das questões da construção da imagem, e seus problemas essenciais de luz, tempo e espaço. A fusão dos dois trabalhos em um, estabelece um diálogo estético tão harmonioso, consagrando a questão estrutural do corpo de obra de Christian Cravo, “luz, tempo e espaço”.
Na psicologia Junguiana, existe uma psique arcaica, possuidora de diversos arquétipos, que é a base de nossa mente individual. Jung (1987) diz que o arquétipo “Anima” é o lado feminino da psique masculina e o arquétipo “Animus” compõe o lado masculino da psique feminina. Partindo da compreensão desses arquétipos, podemos estabelecer uma comparação entre eles e a produção de Christian nos últimos anos.
Seu lado masculino, cruza o Atlântico, faz sucessivas viagens para fotografar a vida animal, a natureza selvagem, imagens marcadas por um distanciamento emocional e ausência de figuração humana (presença marcante em produções anteriores do artista). Para essa mostra, em específico, apenas as imagens produzidas nos desertos da Namíbia estão presentes, o que confirma excesso de aridez, uma certa atmosfera de esterilidade das imagens, quando vistas de forma isolada.
Partindo do pressuposto de que para a personalidade ficar bem ajustada é necessário equilíbrio entre masculino e feminino, a atmosfera infértil das imagens africanas ganha novo sentido e nova potência quando acompanhadas das imagens produzidas no cotidiano do artista, na presença de suas mulheres.
“Anima”, emerge e traz o balanceamento necessário.
Nas imagens de família, temos excesso, afeto, acolhimento, gestação, poder do feminino que acolhe e nutre a vida. A figura humana retorna na obra de Christian Cravo, mas a questão da espacialidade permanece – o gesto do corte, que subtrai das figuras, e da espacialidade, uma fatia do real, pontuado por Lídia Canongia em seu texto “A margem do real”, se preservam, com a mesma ênfase, apenas partes dos corpos são enquadrados e a tomada de campos visuais bem restritos se mantém.
As fotografias recentes de Christian Cravo são tanto abstratas quanto alusivas, e sua produção é contemporânea, ainda que evoque lugares distantes ou tempos arcaicos. “Anima” nos convida a refletir sobre os limites da fotografia, suas questões do imaginário e sua aproximação com o mundo da ficção. No seu universo particular, o que importa para Christian é narrar através das nuances de luminosidade as texturas produzidas por essa luz no decorrer do tempo.
Thais Darzé