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Alberto Pitta

Abertura
17 de janeiro de 2023

Horário
18h

Exposição
17 de janeiro a 18 de fevereiro

ALBERTO PITTA – MÀRIWÔ

NOVOS TRABALHOS DO ARTISTA ALBERTO PITTA

ABERTURA DIA 17 DE JANEIRO DE 2023

 

Vinte trabalhos em pintura e serigrafia (Mix, Clear e Pigmento) sobre Canva, em dimensões variadas, compõem a mais recente mostra, com o título ALBERTO PITTA – MÀRIWÔ, tendo texto de apresentação de Daniel Rangel.

 

Alberto Pitta é um dos pioneiros na concepção de serigrafias com estampas afro baianas, através de símbolos, ferramentas, indumentárias e adereços dos orixás como fonte de inspiração, tendo uma excelência nos fios, nos panos e suas dobras, Alberto Pitta desenvolve em seus trabalhos, pesquisas e criações, o essencial para a interpretação de códigos e símbolos, e de uma estética que o tornam um dos mais importantes artistas visuais brasileiros hoje.

Como designer, principalmente têxtil, e serígrafo, com exposições em vários países em individuais e coletivas, e como carnavalesco, participando de blocos afro, afoxés e de índios, tendo como exemplo os figurinos dos blocos-afro como Filhos de Gandhy, Olodum (antes dos abadás), até se tornar criador e produtor do Cortejo Afro, criado em 2 de julho de 1998, data da Independência da Bahia, pela comunidade de Pirajá. O bloco se destaca na apresentação de valores estéticos no carnaval de Salvador, com desenhos, figurinos, adereços e alegorias, trazendo uma estética própria de volta para as avenidas da cidade.

Tendo nascido dentro dos limites de um terreiro de candomblé, o Ilê Axé Oyá, rapidamente entendeu que na tradição africana, da qual descende, a roupa não responde somente à necessidade utilitária de proteger o corpo, sendo um poderoso elemento significante, que inscreve o homem na natureza e o reconecta a seus ancestrais, afirmando-se como suporte da linguagem e dos marcadores sociais, onde atesta toda a sua autenticidade e força da cultura negra.

Foi observando as atividades de sua mãe, a sacerdotisa Mãe Santinha de Oyá, importante ialorixá de Salvador, do Ilê Axé Oyá, que se dedicava aos bordados richelieu e à educação de crianças e adolescentes da comunidade de Pirajá – seguindo a vocação comunitária do candomblé -, que Pitta viu desde cedo despertar seu interesse pelos panos e arremeter seu compromisso em agregar pessoas através das palavras e das ações. O terreiro hoje, projetado por Lina Bo Bardi, é comandado por Nívea Luz, neta da ialorixá, e tem logo na entrada o barco que simbolizou o “navio de possibilidades” ou “um outro navio que não o negreiro”, no desfile 2018 do Cortejo Afro.

Para Gilberto Gil é um ‘artvista’, um “mensageiro de panos, tintas e axés”, consciente da força de sua arte e de suas atividades, e de sólida formação “como artista plástico e militante dos movimentos negros e mestiços da Bahia lhe tem ensejado um trabalho original e abrangente na aglutinação dos povos fazedores da festa”. Para Caetano Velloso é, talvez, o criador mais importante e mais atuante neste imenso movimento que enche de beleza as ruas a cada carnaval. “Pioneiro das estamparias baiano-africanas, é pensador do processo de que se faz parte e tem todas as características de um artista fino e requintado”.

Alberto Pitta nasceu na Bahia, em 1961, vive e trabalha em Salvador, Brasil e destaca-se no cenário artístico e cultural, indo bem além ao carnaval dos blocos afros, afoxés e de índios em Salvador, quando ainda na década de 1970, se encantou pelas roupas dos blocos de índios, como Apaches e Comanches, inspirados no cinema americano e que caíram no gosto dos homens negros de Salvador. Com exposições em várias cidades brasileiras, e na Alemanha, Angola, EUA, França, Londres, participações em festivais de cultura nacional e internacional, Pitta exerce a atividade de arte-educador, realizando trabalhos no Instituto Oyá de Arte e Educação, ensinando aos jovens o ofício da serigrafia. No Projeto Axé, foi Assessor da Coordenadoria de Arte Educação e Assessor da Coordenação de Cultura, Estética e Arte.

Màriwó – A ancestralidade contemporânea de Alberto Pitta

 

“Ogun a jo é Màriwó
Akóró a jo é Màriwó…”

 

O màriwó, também chamado igi opé, é a folha do dendezeiro, árvore sagrada do candomblé, consagrada para o orixá Ogun. Cada ramo é cuidadosamente desfiado e pendurado em portas e janelas de terreiros e casas de santos, com a função de proteger a energia desses espaços. A exposição “Màriwó” apresenta obras do artista Alberto Pitta, um filho de Ogun, que emanam a força dos orixás, cujos mistérios, entretanto, se mantém protegidos por um trompe l’oeil de grafismos e “màriwós”.

Pitta faz parte de uma geração de artistas pretos cuja produção vem sendo finalmente reconhecida e valorizada pelo sistema de arte, mesmo que de forma tardia. Afinal, são mais de quarenta anos de uma trajetória embalada pelos ritmos, formas, cores e símbolos dos cultos afro-brasileiros e do carnaval da Bahia. Filho sanguíneo da saudosa yalorixá Mãe Santinha de Oyá, sua prática artística revela e esconde segredos de seu entorno pessoal, cuja religião era sua própria moradia – o domicílio ilê – do “ogã das tintas”, como ela o chamava.

As obras de Pitta – pinturas, desenhos, tecidos, roupas, objetos e serigrafias – são testemunhos visuais de uma “ancestralidade contemporânea”. Conceitos que poderiam ser antagônicos se tornam aqui fusão de uma coisa única; expandida no espaço, a partir do encontro de tempos passados que se conformam como objetos artísticos. Referências técnicas e temáticas de uma antiguidade, preservadas e difundidas como um legado de família, e ressignificadas pelo labor poético de um artista sensível e conectado com seu tempo.

A elegância da produção Pitta é digna de reis e rainhas que naturalmente se adornam, pois são a referência de beleza daquilo que representam. Percepções que teve acesso desde criança; ritos que fizeram parte de sua infância; elementos encantados com os quais brincava. Búzios, cabaças, folhas, contas, quartinhas, gamelas, panos e ferramentas sagradas. Uma poética conectada à rigorosa estética da visualidade ritualística das “obrigações” e oferendas das religiões de matrizes africanas. Um refinamento interdisciplinar herdado e preservado por gerações, ressignificado artisticamente.

 

A contemporaneidade se dá na forma, no processo e nos resultados plásticos. Camadas estampadas no tecido-espaço-tela; de tempos aglutinados, de “ontens e hoje; do diálogo entre arte, moda e design; entre a serigrafia e a pintura; entre as culturas iorubana e brasileira (baiana). Arte e vida se entrelaçam como combustível necessário para afirmarmos verdades que foram historicamente apagadas.

A exposição “Màriwó” é um xirê visual de telas-oferendas que encantam e protegem, ao mesmo tempo que refletem e ofuscam saberes e fazeres sagrados. Uma celebração artística ao panteão dos orixás, como um rito de passagem entre o passado e o momento atual em que vive o artista. Pitta das estampas, tecidos e panos; das telas, dos carrinhos de café e instalações; dos cenários, figurinos e exposições; do carnaval, do Cortejo Afro e outros blocos afro da Bahia. Criador de uma identidade própria composta por texturas-pele que compõem uma linguagem gráfica-pictórica de grande impacto visual, que emanam uma forte carga energética. Aquele que estampou o branco sobre branco, como um “estilizado Malevich baiano”.

Pitta busca a essência daquilo que representa, e mesmo quando recorre às cores, muitas vezes desnuda a funcionalidade cromática dessas, que assumem funções energéticas, quase invisíveis. Após uma fruição mais aprofundada em suas obras, aquela que se deixa levar pela afetividade do olhar histórico, é possível encontrar a verdadeira fonte de inspiração e vida, dele e de todos nós: o axé.

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