Construída através de uma recriação do barroco na busca de uma base sólida através da pesquisa histórica, e da descoberta que toda esta iconografia emociona, é uma pintura de exuberante colorido que sai em busca no passado histórico, principalmente no arquitetônico, para uma representação figurativa. Dele temos um ponto de partida, a memória. Daí por diante, num trabalho intimamente ligado a elementos da cultura popular, ou da pop art, no seu tratamento, dividindo o espaço com histórias em quadrinhos, compõe um trabalho onde o popular de suas cenas compartilha vizinhança com imagens oriundas de peças eruditas, principalmente às do barroco das paredes das igrejas baianas, sua azulejaria, santos e anjos, onde todas estas imagens se expõem seduzidas sem economia por suas cores vibrantes. Nesta fase, temos a invenção. Mas esta pintura, na sua representação, na mistura ou no mergulho vertical de estilos, pela técnica ou pela expressão, é o que a liberdade do ato de criar proporciona, principalmente ao utilizar as cores, na maioria puras, intensas, vibrantes, para que possamos ver de outro jeito ou de outra forma o que esteve por tanto tempo diante de nós, como azulejo, ou vestimenta, ou um recorte de um gradil, ou um fragmento de fachada, imagens e representações que povoaram a nossa história, a nossa gente, a nossa terra, elementos formadores do nosso caráter e da nossa cultura, do nosso imaginário.
Iuri Sarmento nasceu em Montes Claros, Minas Gerais, em 1969. Vive e trabalha atualmente em São Paulo. Formou-se em Artes Plásticas pela Escola Guignard, Belo Horizonte. Sua primeira mostra individual foi em 1992, na Sala Corpo de Exposições, Belo Horizonte, seguindo-se o Museu de Arte Moderna da Bahia, em 1999. Uma de suas últimas individuais foi na Galerie Agnès Monplaisir, em Paris, França. Em 1999 foi selecionado para o Projeto Rumos, do Itaú Cultural, e foi um dos vencedores do VI Salão da Bahia (1999). Nos anos que se seguiram, participou de mostra no Centro Cultural Ramón Alonso Luzzy, em Cartagena, Espanha (2000); Pintura Baiana, no Porto, Portugal; Bienal do Mercosul em Porto Alegre, Rio Grande do Sul; e em 2005 da mostra Bahia e Buenos Aires Unidas pela Arte, no Museu de Arte Moderna da Bahia, e no Museo de Bellas Artes de la Boca “Benito Quinquela Martin”, Buenos Aires, Argentina.
Como você identifica o ponto de partida para a criação de sua arte? O que a impulsiona? Como é o seu processo de trabalho?
Tudo na obra é recorrente diante de tudo que já foi feito. Como um fio condutor, eu vou abrindo e ampliando este leque de possibilidades. O que me impulsiona é o desejo de superação, a realização da construção de uma obra. O meu processo de trabalho nada mais é do que um trabalho atrás do outro. Antes de acabar um, a criatividade já está maquinando outras ideias.
O que há da memória na criação de seu trabalho? Memória da arte e memória popular?
Sempre muitas memórias. Meu trabalho sempre vem cunhado de referências que vou garimpando diante de tudo que vai me emocionando. Disto vou bebendo de várias fontes, ou como uma antena. Sim, há muita memória popular, sim.
Um dos pontos ressaltados pela crítica é a investigação histórica que a sua pintura mostra. Como sente esta afirmativa?
A investigação histórica sempre fez parte, desde que cheguei à Bahia, há 15 anos. Tudo aqui era uma descoberta e tudo foi motivo para um novo universo ir se abrindo, e tudo foi vasculhado e percorrido, e sempre ampliando. É um reencontro com algo que está ali, e agora de um outro jeito, mas já estava. E sempre podemos ver de várias formas.
Sobre o seu trabalho, a crítica também ressalta a cor, as cores vibrantes, o diálogo e o choque entre elas. O que é este colorido na composição de seu trabalho?
Uso sempre a cor pura nos meus trabalhos. A Bahia é sempre luz nas minhas pinturas, do branco mais titânio, chegando às vezes a ser ouro ou prata, até o choque de cores fortes, como vermelho e amarelo, os azuis, e todas as outras. Não economizo em cores.
A sua pintura é mesmo um barroco reinventado? Ou a pop art é mais presente?
O barroco sempre foi inspiração para as minhas pinturas. Por ser mineiro estas referências sempre fizeram parte. Mas sempre procurei misturar estilos, como numa paleta. Você pode, depois de uma investigação, começar a perceber várias informações.
É uma pintura alegórica?
Também alegórica. Adoro ornamentos, volutas, fragmentos arquitetônicos e outros.
Este é um momento de múltiplas ações – pintura, desenho, esculturas, fotografia, vídeo, instalações, performances, o meio digital como veículo de criação. Como se situa dentro deste panorama, sendo essencialmente um pintor?
Não acredito mais em um só segmento. Acho que arte contemporânea é justamente esta liberdade que o artista pode se dar passeando por várias técnicas e formas de se expressar, como também acho que podemos ficar totalmente imersos numa só técnica e explorar o máximo dela. No que venho fazendo, dou prioridade, sim, à pintura, pois ela pede muito tempo, mas vou experimentando outras possibilidades.
Quais são os artistas que o estimulam ou são de sua preferência? Quem você admira?
São muitos a me estimularem: Giotto, Velázquez, Matisse, Andy Warhol, Julien Schnabel.
Como vê o mercado para artistas contemporâneos como você?
Acredito, sim, que este mercado está crescendo, e acho que as pessoas estão mais próximas dos artistas denominados contemporâneos.
Como vê a arte agora no Brasil e, mais especificamente, na Bahia?
Já é uma realidade, já há uma consolidação, sim, de artistas no mercado internacional, o caso de Beatriz Milhazes,Tunga, Ernesto Neto, e outros. Na Bahia acho que se pode ver o sucesso de artistas como Marepe, Caetano Dias, Ayrson Heráclito. A arte baiana vai muito bem, obrigado.
(entrevista / maio de 2008)