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Leda Catunda

Opening
24 de November de 2011

Schedule
19 às 22h

Exhibition
25 de November a 31 de December

Pessoal e inconfundível, uma obra sintonizada com o seu tempo. Esta pode ser uma descrição do trabalho da artista Leda Catunda, que a partir do dia 24 de novembro, até dia 31 de dezembro, estará expondo “O circo pegou fogo”, na Paulo Darzé Galeria, tendo como tema a iconografia do mundo do esporte. Esta é sua primeira individual na Bahia.

Na mostra “O circo pegou fogo”, na Paulo Darzé Galeria, estarão sendo apresentadas quinze a vinte pinturas-objeto em acrílica sobre materiais diversos, de forma geral realizadas sobre camisetas e materiais relativos a esportes variados, tais como skate, basquete e futebol, entre outras. Para Leda Catunda, “as obras apresentam um forte caráter construtivo na sua elaboração, que se dá através de formatos não ortogonais, de sugestão orgânica, em escalas variadas”. A atitude de apropriação de “imagens prontas” presente na poética da artista desde o início foi mantida, no entanto, a natureza dos materiais apropriados modificou-se e consequentemente a visualidade contida neles. Se anteriormente, as pinturas refletiam questões que giravam em torno do gosto médio por conterem imagens e texturas presentes em materiais de uso cotidiano tais como cobertores, toalhas e tecidos utilizados em decoração, agora, o caráter pop, advindo das cores e dos assuntos presentes nas camisetas esportivas, tornou-se a característica predominante deste momento da produção. “O fenômeno da necessidade de identificação através de elementos visuais do sujeito contemporâneo motivou toda essa nova série. Desta maneira, os elementos que surgem inseridos como imagens nessas obras possuem um caráter intensamente gráfico, tais como: listras de cores fortes, números, marcas, patrocínios, emblemas e nomes. Assim, interessa a visualidade presente em símbolos quer sejam de times, quer sejam de marcas, que habitam as camisetas das pessoas nas ruas. Quando no meio da multidão podemos facilmente encontrar o número trinta e quatro ou um sete, grafado em cores contrastantes, se afastando nas costas de alguém” diz a artista. “Que sentimento dirige essas escolhas? Quais as crenças ou os afetos envolvidos que geram tal necessidade de identificação? São essas algumas das questões que circundam a poética atual, presente nesse conjunto de obras”.

Com uma pintura inovadora nas artes plásticas, à medida que, se revela um instrumento de indagação sobre a forma e sobre a percepção do mundo, Leda Catunda é um dos integrantes da Geração 80, período em que seu trabalho retira imagens do cotidiano, elimina alguns detalhes, aplica tinta sobre lençóis, toalhas, cobertores, colchões, capachos, guarda-chuvas, cortinas de banheiro e couro de vaca, gerando novas imagens. Depois, as figuras impressas perderam espaço para figuras sugeridas. Entraram barrigas, gotas, insetos e véus – que ela criava recortando tecidos como veludo e seda em formas circulares ou ovais, onde se fixa a figuras geométricas, eliminando narrativas. Os tecidos eram pregados sobre uma tela plana, criando volume, depois recebendo camadas de tinta, tendo como acabamento o emprego de técnicas como a costura. É o que ela chama de “pinturas moles” pinturas que ao invés de serem telas com a superfície coberta de tinta e presas a um chassi, são estruturados diretamente na parede e, além de tinta, se utilizam de tecidos, como voile, algodão estampado, jeans, veludo e plástico. Estas características acompanham a produção de Leda Catunda até hoje, num trabalho que exerce uma crítica a banalização das imagens em nossa sociedade, ao tempo em que provoca o espectador, ao realizar obras com volumes, espessuras e texturas, acarretando além da observação um impulso táctil e orgânico, com obras de um inegável sucesso de público. Como diz o crítico Jacopo Crivelli Visconti: “Resta definir se isso acontece porque retrata de maneira essencialmente fiel os gostos atuais, ou pelo prazer físico que as suas superfícies macias sugerem, ou talvez, mais simplesmente, por serem belas”.

Leda Catunda nasceu e vive em São Paulo. Formada pela Faculdade Armando Álvares Penteado (FAAP) em 1984, teve como professores de graduação – Júlio Plaza, Regina Silveira, Walter Zanini e outros – que a introduziram no universo de arte conceitual, como pode ser observado nas suas primeiras obras em litografia. Sua estreia em mostras se deu por meio da então diretora do MAC-USP, Aracy Amaral, na exposição “Pintura como Meio”, em 1983. Mas ganha destaque nacional após participar da exposição na “Geração 80, como vai você?”, na Escola de Artes Visuais do Parque do Lage, Rio de Janeiro, em 1984. A partir desta mostra, conquista o mercado e a crítica de arte. Além de pintora, artista multimídia e gravadora, Leda Catunda lecionou na FAAP de 1986 a meados da década de 90, tendo realizado doutorado em poéticas visuais na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, em 2001. Na sua trajetória participou de três Bienais de São Paulo (1983, 1985 e 1994) e grandes mostras coletivas como Modernidade (Paris, 1987), Artistas Latinos-Americanos do Século 20 (Museu de Arte Moderna de Nova York, 1993) e Mostra do Redescobrimento (São Paulo, 2000), possuindo obras em coleções públicas e particulares no Brasil e no exterior, expondo na Espanha, França, Holanda, Portugal, Suécia, Alemanha, Cuba, Argentina, Porto Rico, Venezuela, México, Estados Unidos, Japão, Austrália e várias cidades brasileiras.

Pessoal e inconfundível, uma obra sintonizada com o seu tempo. Esta pode ser uma descrição do trabalho da artista Leda Catunda, que a partir do dia 24 de novembro, até dia 31 de dezembro, estará expondo “O circo pegou fogo”, na Paulo Darzé Galeria, tendo como tema a iconografia do mundo do esporte. Esta é sua primeira individual na Bahia.

Na mostra “O circo pegou fogo”, na Paulo Darzé Galeria, estarão sendo apresentadas quinze a vinte pinturas-objeto em acrílica sobre materiais diversos, de forma geral realizadas sobre camisetas e materiais relativos a esportes variados, tais como skate, basquete e futebol, entre outras. Para Leda Catunda, “as obras apresentam um forte caráter construtivo na sua elaboração, que se dá através de formatos não ortogonais, de sugestão orgânica, em escalas variadas”. A atitude de apropriação de “imagens prontas” presente na poética da artista desde o início foi mantida, no entanto, a natureza dos materiais apropriados modificou-se e consequentemente a visualidade contida neles. Se anteriormente, as pinturas refletiam questões que giravam em torno do gosto médio por conterem imagens e texturas presentes em materiais de uso cotidiano tais como cobertores, toalhas e tecidos utilizados em decoração, agora, o caráter pop, advindo das cores e dos assuntos presentes nas camisetas esportivas, tornou-se a característica predominante deste momento da produção. “O fenômeno da necessidade de identificação através de elementos visuais do sujeito contemporâneo motivou toda essa nova série. Desta maneira, os elementos que surgem inseridos como imagens nessas obras possuem um caráter intensamente gráfico, tais como: listras de cores fortes, números, marcas, patrocínios, emblemas e nomes. Assim, interessa a visualidade presente em símbolos quer sejam de times, quer sejam de marcas, que habitam as camisetas das pessoas nas ruas. Quando no meio da multidão podemos facilmente encontrar o número trinta e quatro ou um sete, grafado em cores contrastantes, se afastando nas costas de alguém” diz a artista. “Que sentimento dirige essas escolhas? Quais as crenças ou os afetos envolvidos que geram tal necessidade de identificação? São essas algumas das questões que circundam a poética atual, presente nesse conjunto de obras”.

Com uma pintura inovadora nas artes plásticas, à medida que, se revela um instrumento de indagação sobre a forma e sobre a percepção do mundo, Leda Catunda é um dos integrantes da Geração 80, período em que seu trabalho retira imagens do cotidiano, elimina alguns detalhes, aplica tinta sobre lençóis, toalhas, cobertores, colchões, capachos, guarda-chuvas, cortinas de banheiro e couro de vaca, gerando novas imagens. Depois, as figuras impressas perderam espaço para figuras sugeridas. Entraram barrigas, gotas, insetos e véus – que ela criava recortando tecidos como veludo e seda em formas circulares ou ovais, onde se fixa a figuras geométricas, eliminando narrativas. Os tecidos eram pregados sobre uma tela plana, criando volume, depois recebendo camadas de tinta, tendo como acabamento o emprego de técnicas como a costura. É o que ela chama de “pinturas moles” pinturas que ao invés de serem telas com a superfície coberta de tinta e presas a um chassi, são estruturados diretamente na parede e, além de tinta, se utilizam de tecidos, como voile, algodão estampado, jeans, veludo e plástico. Estas características acompanham a produção de Leda Catunda até hoje, num trabalho que exerce uma crítica a banalização das imagens em nossa sociedade, ao tempo em que provoca o espectador, ao realizar obras com volumes, espessuras e texturas, acarretando além da observação um impulso táctil e orgânico, com obras de um inegável sucesso de público. Como diz o crítico Jacopo Crivelli Visconti: “Resta definir se isso acontece porque retrata de maneira essencialmente fiel os gostos atuais, ou pelo prazer físico que as suas superfícies macias sugerem, ou talvez, mais simplesmente, por serem belas”.
Leda Catunda nasceu e vive em São Paulo. Formada pela Faculdade Armando Álvares Penteado (FAAP) em 1984, teve como professores de graduação – Júlio Plaza, Regina Silveira, Walter Zanini e outros – que a introduziram no universo de arte conceitual, como pode ser observado nas suas primeiras obras em litografia. Sua estreia em mostras se deu por meio da então diretora do MAC-USP, Aracy Amaral, na exposição “Pintura como Meio”, em 1983. Mas ganha destaque nacional após participar da exposição na “Geração 80, como vai você?”, na Escola de Artes Visuais do Parque do Lage, Rio de Janeiro, em 1984. A partir desta mostra, conquista o mercado e a crítica de arte. Além de pintora, artista multimídia e gravadora, Leda Catunda lecionou na FAAP de 1986 a meados da década de 90, tendo realizado doutorado em poéticas visuais na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, em 2001. Na sua trajetória participou de três Bienais de São Paulo (1983, 1985 e 1994) e grandes mostras coletivas como Modernidade (Paris, 1987), Artistas Latinos-Americanos do Século 20 (Museu de Arte Moderna de Nova York, 1993) e Mostra do Redescobrimento (São Paulo, 2000), possuindo obras em coleções públicas e particulares no Brasil e no exterior, expondo na Espanha, França, Holanda, Portugal, Suécia, Alemanha, Cuba, Argentina, Porto Rico, Venezuela, México, Estados Unidos, Japão, Austrália e várias cidades brasileiras.

Assinando o catálogo da mostra, o crítico Jacopo Crivelli Visconti afirma:

Sem dúvida, há quem ache que as coisas nunca estiveram tão bem, que estamos seguindo o caminho certo, que “nunca antes, na história deste país…”, ou até deste planeta, se viram tanta riqueza e tanta felicidade e que, corrigidas as últimas falhas e solucionados os últimos problemas, rumaremos finalmente para a paz, o progresso, a ordem e a abundância… Mas a verdade é que a maioria de nós gosta de lembrar dos velhos tempos, de quando as crianças podiam brincar na rua, o trânsito era um fenômeno quase desconhecido, e a vida era mais cheia de poesia e ingenuidade (ou ao menos assim nos parece hoje). As coisas, de forma geral, duravam mais: os presentes ganhos no Natal ainda pareciam novos em maio, era normal usar as mesmas roupas ao longo de anos, ninguém trocava de carro a cada estação, e dava para aprender os nomes dos jogadores do seu time de futebol: de um ano para o outro não mudava quase ninguém. A mesma tendência à idealização do passado que nos faz lembrar de poesia e ingenuidade onde talvez não houvessem, sugere também que esse “ritmo” diferente não tinha apenas a ver com uma escassez de meios: era, muito antes disso, indício de uma relação diferente com o mundo, uma relação que não seria errado definir mais ética. Agora estamos todos conectados, redes (antis)sociais nos vigiam por todos os lados, mesmo parados no trânsito temos como verificar que as crianças não estejam na rua, e a lógica do “descartável” predomina: tudo tem que ser “em tempo real”, o interesse de um assunto qualquer depende apenas da sua novidade, em dez minutos tudo é obsoleto. Vários jogos de futebol passam a cada dia, ao vivo, na televisão, e todos conhecemos os nomes dos mesmos jogadores, às vezes sem nem saber para que time jogam, hoje (antes do jogo de amanhã, é claro, tudo poderá ter mudado).

 

Considerando que, desde o início da sua carreira, Leda Catunda expõe as idiossincrasias e as evoluções do imaginário popular, a decisão recente de se voltar para o universo esportivo é perfeitamente coerente e compreensível, quase lógica. Os logotipos, as imagens, as cores, os símbolos, os números: todo o repertório visual do esporte aparece nessas obras, cada elemento competindo com os outros, tentando sobrepor-se aos que o rodeiam, até preencher cada centímetro do espaço à disposição. Quem acompanha o trabalho da artista há algum tempo sabe que essa necessidade de ocupar a totalidade da tela constitui um dos traços característicos da iconografia da artista, marcada, poder-se-ia dizer, por um profundo horror vacui: nada pode ficar vazio em suas criações, e o branco, equivalente cromático do vazio, é banido. Pode ser interessante lembrar que numa das suas primeiras séries de pinturas, coletivamente intituladas Vedações, elementos da estampa dos tecidos empregados eram destacados cobrindo a quase totalidade do resto do campo da pintura com uma camada uniforme de tinta: ou seja, ao precisar de um vazio para destacar alguns elementos, a artista renunciava a pintar esses elementos, deixando-os a flutuar num vazio “real”, mas criava um “falso” vazio sobre um fundo pré-existente, quase afirmando que era exatamente esse fundo a permitir que o espaço vazio se sustentasse. Por outro lado, é evidente que a maneira como os elementos parecem brotar um do outro nessas pinturas é perfeitamente coerente com o hábito, cada vez mais generalizado em âmbito esportivo, de recobrir de logotipos de patrocinadores cada centímetro de camisetas, carrocerias, bonés, raquetes e qualquer outra superfície disponível. E mais, é coerente com a maneira como o mundo, conforme dizia-se antes, torna-se a cada dia mais cheio, mais transbordante de imagens, estímulos, notícias, coisas. Essa correspondência não deve ser considerada casual: o fato das obras da Leda Catunda terem sido construídas desde o início por sobreposição, seja de camadas de tinta ou, fisicamente, dos próprios materiais, denota uma profunda sintonia com o seu tempo. De certa maneira seria correto dizer que, desde o começo dos anos 1980, quando a artista iniciou a sua produção, suas pinturas vêm apontando para onde está indo o mundo, de forma análoga ao que fazia, por exemplo, a célebre colagem de Richard Hamilton, O que exatamente torna as casas de hoje tão diferentes, tão fascinantes? (1956), considerada o marco zero da arte pop. Ambivalente como a maioria da autêntica arte pop, que oscila entre um genuíno fascínio e a crítica mais ácida à sociedade que retrata e da qual é consciente de ser filha, a colagem de Hamilton deve ser considerada uma referência importante para a obra de Leda Catunda, que mantém uma ambivalência análoga em relação ao seu sujeito, e é construída quase sempre como uma colagem, mesmo quando o ato de colar um elemento no outro não é realizado fisicamente, mas com o pincel.

 

Pode valer a pena aprofundar a reflexão sobre o caráter ambivalente, e até enigmático da produção da Leda Catunda, e mais especificamente da série dos esportes. A própria artista confessa não ter uma posição unívoca em relação à progressiva contaminação e miscigenação da iconografia esportiva, que vem renunciando à pureza ideal da modernidade, que poderíamos exemplificar com a imagem de um número (de preferência escrito numa serigrafia elementar, sem serifa) sobre um fundo monocromático, em favor de uma mistura carnavalesca em que os números convivem com patrocínios, escritas e cores os mais diversos e estridentes. No âmbito da discussão mais ampla sobre os critérios e a evolução do gosto que, como dizia-se, permeia a pintura de Leda Catunda desde seus primórdios, parece lícito atribuir à série dos esportes um valor metonímico: ao focar esse universo, a artista convida o observador a olhar para uma transformação geral, que diz respeito à sociedade como um todo. Mas a artista, como se dizia, não toma partido, limita-se a observar o processo, olha o circo pegar fogo, e enquanto isso se apropria de alguns casos extremos, sem revelar se os considera as aberrações mais gritantes, ou os momentos mais sublimes. É desse repertório ontologicamente idiossincrático que surge o fascínio dessas obras, da contradição quase palpável entre a iconografia colorida e, se não bela num sentido convencional, frequentemente atraente e até aconchegante, e o repertório iconográfico, e até físico, ao qual atinge para a construção do seu imaginário. Toalhas, lençóis, casacos, camisetas, tecidos estampados, até colchões têm confluído, ao longo desses anos, em suas pinturas, sempre trabalhados de maneira a deixar à vista as características do material, e principalmente a fatura e o sujeito das estampas e decorações que os revestiam. E essas estampas e decorações, praticamente em sua totalidade, provinham do universo popular, feito de personagens de Walt Disney, fotografias de paisagens estereotipadas impressas toscamente, animais estilizados e em poses insólitas ou até grotescas, a compor um pequeno compendio do que, de acordo com uma visão talvez elitista, poder-se-ia considerar uma iconografia barata, esteticamente pobre e sem nenhum conteúdo. Apesar dessa interpretação, como é sabido, a obra de Leda Catunda goza de um inegável sucesso de público, resta definir se isso acontece porque retrata de maneira essencialmente fiel os gostos atuais, ou pelo prazer físico que as suas superfícies macias sugerem, ou talvez, mais simplesmente, por serem belos, da mesma forma como é bela a colagem de Richard Hamilton citada acima.

 

Complementando essas considerações, é importante esclarecer, se é que ainda não ficou suficientemente claro, que a beleza, pelo menos se entendermos esse termo no sentido convencional, não está entre as características que a artista busca para a sua pintura. O inegável apelo das suas obras é antes tátil, orgânico, do que estético: curiosamente, em se tratando de pinturas, o observador sente o desejo, quase a necessidade em alguns casos, de tocar, apalpar as superfícies, comprovar com a mão o que o olho sugere, mas não se atreve a garantir, isto é, a maciez dessas obras. E de fato, em sua tese de doutorado, a artista recorria à expressão “poética da maciez” para analisar as obras produzidas a partir do começo dos anos 1990, isto é, pinturas que, mesmo mantendo-se ancoradas à parede, esparramavam-se pelo chão, ou avultavam-se no espaço, em formas recorrentes que aludiam, como explicitado pelos títulos, a “barrigas”, “línguas”, “insetos”, etc… Trata-se, sem dúvidas, de um dos períodos criativos mais férteis e também mais conhecidos da artista, e não cabe estender-se, aqui, numa análise de suas características, mas é importante lembrar dessa produção porque agora, após quase vinte anos, a série dos esportes vem apontando para um caminho novo, menos propenso à tridimensionalidade. Não se trata, naturalmente, de uma mudança radical, considerando que vários trabalhos ainda saem da parede, mesmo que de maneira mais contida, e de qualquer maneira, na obra e no pensamento da Leda Catunda as coisas sempre se misturam e se fundem, e a adesão à tridimensionalidade nunca teve um caráter militante ou exclusivo. É, contudo, importante ressaltar essa característica da série atual, porque a prevalência  do bidimensional pode decorrer da “força” do tema escolhido, como se seu valor iconológico fosse suficiente a justificar o predomínio da visualidade, sem necessidade de irromper no espaço para criar um impacto e transmitir uma mensagem. E essa força da visualidade do esporte deriva em parte da empatia imediata que cria no público, pelo menos na parcela que reconhece os símbolos e as cores que ama ou odeia, mas também, ou principalmente, do caráter metonímico mencionado anteriormente, que faz com que essas obras se tornem extremamente esclarecedoras de uma certa tendência na visualidade e até, se quisermos, na sociedade contemporâneas, em que tudo parece estar à venda: as sentenças nos tribunais, cada milímetro quadrado do capacete do campeão de motocicleta Valentino Rossi, os votos no senado, os diálogos da novela das oito…

 

O mais inexplicável nesse processo todo é que, num anseio irrefreável de identificação e emulação, mesmo quem não ganha nada com isso (aliás, a rigor, paga) sente-se protegido se puder vestir uma camiseta com as mesmas cores do seu time, o mesmo número do seu ídolo, e também, por que não?, os mesmos patrocinadores. E é aqui, no desejo visceral do fã de se apropriar de todo e qualquer símbolo, que se revela a alma da emulação, a superficialidade da paixão e também, em alguns casos, seu caráter profundamente enigmático, como quando um simples número, retirado das costas do ídolo, reaparece, já completamente esvaziado de significado e função, nas costas de um jovem anônimo, silencioso e perplexo, num ônibus que ruma para a periferia, ou, para citar um caso real noticiado nos dias em que esse texto estava sendo pensado e escrito, nas de um ladrão que atacava padarias e supermercados vestindo sempre a camisa de Cristiano Ronaldo, o que facilitou o seu reconhecimento e, finalmente, a sua captura. A vida imita a arte, e nos revela sem sombra de dúvida como o que Leda Catunda, à sua maneira personalíssima e inconfundível, nos apresenta, é um pequeno teatro do absurdo, uma reprodução fiel, e que contudo beira o grotesco, dos abusos e das loucuras da sociedade do espetáculo.

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